quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O GALO NÃO VENCEU, DEU EMPATE!

Antes do jogo de ontem, quarta-feira, meu sobrinho e afilhado Daniel Miranda me pediu para escrever previsão sobre o resultado de Atlético e Cruzeiro.
Prometi escrever, não escrevi, empaquei.
Mas após o jogo, tive uma iluminação transcedental.
Fiz uma previsão sobre o passado (não é fácil prever o passado, apesar das discordâncias de Proust) e outra sobre o futuro (que também não é fácil de prever, apesar das discordâncias do pastor Malafaia).
O jogo entre Atlético e Cruzeiro, ontem, no Independência, terminou empatado, embora o Atlético tenha vencido – com justiça – por 2 a 0.
Esta é a previsão sobre o passado.
Não se aflijam, eu explicarei mais adiante.
Antes da explicação, é preciso dizer que Atlético e Cruzeiro é um jogo sem diminutivos.
Não é Fla-Flu, ou Gre-Nal, ou San-São opu Atle-Tiba, sejam quais forem os diminutivos.
Também não é Clássico das Multidões, ou Clássico dos Milhões, disto ou daquilo porque não precisa ser denominado como coisa que já é: clássico.
Houve tentativas de apelidar o jogo de Rapo-Galo, Galo-Zeiro e outras tantas engenhosidades linguísticas.
Em vão.
Não cabem em diminutivos.
É Atlético e Cruzeiro e basta.
Basta, porque Atlético e Cruzeiro não é de agora, é histórico, pre-histórico, a-histórico, fantasmagórico, embora tenha começado, na era moderna, em 1921, prenunciando a Semana de Arte Moderna.
Atlético e Cruzeiro instauraram a modernidade brasileira.
Este começo, no entanto, é apenas reflexo de um jogo de milênios.
Poucos sabem, apenas os iniciados, mas antes do Brasil ser descoberto, a Raposa e o Galo já se enfrentavam.
Os Tapuias jogavam uma espécie de futebol chutando uma bexiga de queixada. Os times pintavam-se de azul e de preto e branco. Portanto, quando os ingleses “inventaram” o futebol no século XIX, Atlético e Cruzeiro já se enfrentavam há séculos no interior do Brasil.
Não me esqueci que devo explicar sobre o empate de ontem, chegarei lá, tenham paciência.
Quatro mil anos atrás, os Maias jogavam futebol nas terras baixas da Guatemala com uma bola de latex que era arremassada com os pés e com os quadris através de um anel de pedra preso numa lateral do campo.
E, aqui, o dado arqueológico irrefutável: uma equipe pintada de azul e branco duelava com a equipe pintada de preto e branco.
Daqueles tempos primordiais de Atlético e Cruzeiro, os arqueólos já encontraram 45 campos de jogo.
Há dois mil anos, o poeta chinês Liyu escreveu um poema estraordinário que nos dá a dimensão do que sempre foi um Atlético e Cruzeiro.
“A bola redonda e o campo quadrado,
Semelhantes à Terra e ao Céu
E a bola sobre nós pairando como a lua,
Enquanto duas equipes se enfrentavam.
Uma vestida de preto, outra vestida de azul.
Os capitães consagrados para manter o jogo
Seguiam as regras imutáveis
Sem favorecer amigos ou parentes
Sem permitir parcialidades.
Resoluções definitivas e altivas.
Não havia lugar para omissões.
Assim como princípios honrados governam o jogo,
Devem governar também a luta pela vida”.
Como podemos notar, Atlético e Cruzeiro já se enfrentaram no Egito antigo, se enfrentaram entre os Tapuias, entre os Fenícios, entre os Maias, na China antiga, no mundo inteiro antes da história conhecida.
E agora a prometida explicação:
O jogo terminou empatado porque Atlético e Cruzeiro não tem fim.
Quem pode vencer um jogo que nunca termina?
Entre uma e outra partida a igualdade é reposta inexoravelmente.
Pouco depois dos dois a zero, instantes depois, o empate se afirmou novamente, pois nenhum dos times pode vencer o outro.
Um amigo do Facebook, morador de Nova Iorque, reclamou: “Tem um maluco no prédio em frente gritando Galo”.
O que “Galo” pode significar para os novaiorquinos?
Mas garanto que todos entenderam.
É um grito que ecoa por séculos, milênios.
Galôôô, Zerôôô!!!
Mas atleticanos sabem que não venceram, que o jogo continua e continuará e que vão se encontrar em pé de igualdade outra e outra vez.
Este jogo não foi feito para ter um vencedor e um vencido.
Foi feito para que o azul e branco e o preto e branco duelem eternamente e eternamente reconheçam as próprias forças.
Esta é a previsão sobre o futuro.
Se o Cruzeiro vencer o jogo de volta no Mineirão haverá uma grande festa azul, mas instantes depois todos os cruzeirenses saberão que o jogo terminou com um empate.
Meu primeiro Atlético e Cruzeiro, assisti em 1959, eu menino, ano do tricampeonato azul.
Logo depois do jogo, tive a certeza de que a vitória fora apenas uma ilusão.
O jogo sem fim terminara com um empate.

O maluco de Nova Iorque, depois de gritar solitariamente sobre Manhattan, soube que o jogo continuou empatado.